21 de novembro de 2024   
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DOS RECURSOS DA TERRA E SEU APROVEITAMENTO

O solo ubérrimo, o clima propício e o milagre da riqueza hídrica da Madeira, aliando-se à majestade e à grandeza esmagadora dos panoramas sem par, foram os dotes oferecidos aos conquistadores de tão excepcionais dons.
Mas, qual noiva recatada, guarda-os avaramente. De tal modo, que, passados cinco séculos de esforços hercúleos na conquista de tais tesouros, continua mais apetecida do que na primeira hora. Dando-se generosamente em tão dilatado período, cada vez mais se aformoseia; longe de se esgotar, antes se desentranha em frutos de toda a espécie, e, mãe cheia de fecundidade, vê crescer o número de seus filhos em progressão dificilmente igualada.
A sua adaptação maravilhosa ao meio, o instinto de defesa contra os poderosos e o anseio pela posse do lar próprio criam mais um regime especial – o da prosperidade –, que não se dirá estar em perfeita harmonia com os preceitos básicos das nossas doutrinas constitucionais e com a índole da nossa época, mas que se reconhece como o maior factor da extraordinária transformação agrária sofrida pelos solos cultiváveis da Madeira nos cinco séculos de povoamento e da grande produtividade dos terrenos da ilha, a raiar, aqui e além, pelo extraordinário.
O solo natural só está à vista quando falta a água; fora disso, desde o mar até ao limite superior da faixa litoral cultivada e habitada, a tocar pelos 500 a 600 metros de altitude, e por vezes ainda mais, a topografia sofreu radical modificação, e a agrologia, criada pelo homem na maior manifestação de intemperismo que conhecemos, é a de um ajardinado de infindos canteiros a trepar pelas encostas e de dimensões tão estreitas que, por vezes, não excedem as exíguas do lar. Descose-se a terra, desmonta-se a rocha, constrói-se o juro e também, sucedendo faltar frequentemente a primeira, supre-se a deficiência buscando-a e achando-a mais além. E, dentro em pouco, onde era pousio escalvado, quase a olhar o zénite ou o fundo do abismo, aparece um tabuleiro de verde perene. Para o manter é mister, porém, saciá-lo amorosamente com a rede vascular de centenas de regos e levadas, que, numa extensão superior ao milhar de quilómetros, vão haurir a água aos recônditos das montanhas e a conduzem pelas encostas e cristas, chãs e despenhadeiros, cruzando-se em todas as direcções, num amálgama de traçados, o qual, sendo talvez penhor da independência ciosamente mantida pelos inúmeros grupos dos seus utentes e justificando-se de certo modo pelo extraordinário interesse suscitado pela água, conduz a maior dispêndio na conservação e não consente porventura o melhor aproveitamento do bem tão dificilmente obtido e disputado.

(Continua)

(Parte CIV de …)


15 Anos de Obras Públicas – 1.º Vol. Livro de Ouro 1932-1947 (104)

(Fonte: 15 Anos de Obras Públicas – 1.º Vol. Livro de Ouro 1932-1947 – APROVEITAMENTOS HIDRÁULICOS DA MADEIRA – Manuel Rafael Amaro da Costa – Presidente da Comissão Administrativa dos Aproveitamentos Hidráulicos da Madeira)

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