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Não há regra fixa, matemática, uniforme para determinar a proporção em que deve recorrer-se ao imposto e ao empréstimo: depende isso, em grande parte, do conceito dos governantes e da virilidade dos povos. Mas no ponto a que haviam chegado as coisas em Portugal, ninguém de são critério poderia já defender que se continuasse a usar e a abusar do crédito para pagar despesas correntes, e não só porque, há muito já fora da razão e da normalidade, o sistema não poderia ser praticado por mais tempo, mas ainda porque se hipotecariam ao presente os rendimentos das futuras gerações, a quem, para sempre talvez, se cortava a possibilidade de realizar, conforme as exigências do seu tempo, as condições do progresso nacional. Deste primeiro ponto de vista resultava que devia considerar-se fechado o recurso ao crédito para tudo quanto não fossem obras de utilidade geral para nós e para os vindouros. Temos uma dívida pública que não pode considerar-se grande e que absorve uma percentagem não exagerada das nossas receitas, quando a comparamos com a de outras nações; mas é grande o atraso do País, e é para preencher as lacunas deste atraso que deve ciosamente guardar-se toda a nossa reserva de crédito; mais um motivo para sobre a geração actual, apenas, haverem de recair todos os encargos ordinários da administração pública. O primeiro sentido desta política de sacrifício é que há uma geração sacrificada ao futuro da Pátria — a nossa geração. Se dividirmos em duas grandes classes toda a população segundo a sua posição de credora e devedora — de um lado os proprietários, os portadores de títulos, os capitalistas, os funcionários, os operários (também credores pelos seus vencimentos e pelos seus salários), e do outro, comércio, indústria, agricultura, em geral trabalhando a crédito e, portanto, devedores; se supusermos dividida a população nestes dois grupos, verificar-se-á que as desvalorizações sucessivas da moeda beneficiam um grupo e sobrecarregam outro, exoneram de dívidas a produção e por isso a facilitam momentaneamente, mas vêm por fim a destruir as condições do seu desenvolvimento e a capacidade consumidora dos seus mercados. Com este pensamento impunha-se não sacrificar mais os capitais — base, factor do progresso económico futuro — e, para os poupar, chamar aos sacrifícios necessários todos os rendimentos da Nação. Daqui o duplo objectivo — assegurar, tanto quanto possível, valor estável à moeda e sobretudo não permitir novas depreciações; depois, elevar a tributação ao nível exigido pelas reais necessidades do Estado.
O Problema Financeiro (03)
(«Política de verdade. Política de sacrifício. Política nacional») — Discurso na manifestação dos municípios do País, em 21 de Outubro — («Discursos», Vol. 1, págs. 30-31 e 32-33) - 1928 Consultar todos os textos »»
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