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Mas desde que se apresentou com suficiente solidez a nossa regeneração financeira, e foram possíveis avultados empréstimos e outras conversões, fazer alguma coisa vasta e profunda com a dívida externa passou a ser ponto necessário do programa. Quando? Em que termos? Estas operações têm a sua oportunidade e são as condições do momento que indicam a directriz. As condições desta suscitaram-nas as alterações dos valores monetários a que temos assistido. O momento é este e não outro, desde que é intuito do Governo sobretudo lograr o benefício moral da nacionalização da dívida, não fazer lucros nem conseguir diminuição de despesa, mas vir em auxílio dos credores, para evitar-lhes a baixa eventual dos rendimentos e a desvalorização dos capitais. Aos financeiros ansiosos de maiores triunfos — traduzidos na diminuição dos encargos do Tesouro ou na amputação substancial da dívida, sem qualquer consideração pelos interesses dos portadores dos títulos — aconselharia eu que aguardassem mais tempo ainda. Mas nós sentimo-nos ligados por princípios de moral na administração pública, e estes não nos permitem desinteressar-nos da situação criada aos credores do Estado pelos acontecimentos internacionais. Sob este aspecto a conversão do nosso externo deve ficar nos convulsionados tempos que vivemos, entre tantas manipulações financeiras de fins diametralmente opostos, como espécie rara e padrão de lealdade e seriedade do Estado. Este é em poucas palavras o interesse material e privado dos portadores dos títulos, e que os aconselha a converter a sua dívida externa; mas há interesses morais em jogo que correspondem precisamente ao interesse nacional da operação e em que patrioticamente todos devem colaborar. Os portugueses desperdiçaram nas últimas dezenas de anos muitos milhões espalhados por várias partes do Mundo, e dessa perda se tem ressentido fortemente a nossa economia — sangrada em elementos de vitalidade quando emigravam, depauperada porque não voltaram nem renderam. Um movimento se salva económica e moralmente — o da repatriação da dívida externa que, embora pesasse todos os anos na procura de divisas estrangeiras para a compra dos títulos no mercado externo, produziu a sua quase completa nacionalização. Pouco a pouco, os portugueses se foram dando conta de que, estando em ordem a sua própria casa, nenhuma segurança ou garantia estranha excedia a do seu País. Pelos cálculos que puderam fazer-se sobre a importância dos juros pagos em Portugal e no estrangeiro, e tendo-se em conta os títulos de nacionais cujos rendimentos são cobrados fora do País, pôde chegar-se à conclusão de que nos últimos anos o repatriamento da dívida externa se fazia por valor superior a 400 000 libras anuais, devendo encontrar-se hoje em mãos de portugueses entre 80 e 90 % da totalidade dos títulos. A conversão destes títulos em dívida interna não é senão fazer corresponder a aparência à realidade e consolidar a situação livremente criada. Mal ficaria a portugueses dar a entender que a preferência pelo Externo é função das garantias especiais do título, substituídas, quanto ao novo Consolidado, pelas que usufrui toda a nossa dívida pública, e que é a 10 % de estrangeiros, ou seja às possíveis pressões dos seus Governos — aliás inoperantes nos tempos modernos, como se tem visto — que confiam a segurança dos maiores valores mobiliários portugueses. Estamos já felizmente muito longe, no que respeita a sensibilidade nacional, do estado de espírito que pudesse sem revolta aceitar o problema em tais termos. Os nacionais virão pois à conversão; e, se além deles vierem também os estrangeiros, isso será a maior afirmação de confiança no escudo, que ele inteiramente merece pela importância e solidez das suas reservas, mas que nem por isso deixará de nos lisonjear. A um ou outro portador pode parecer que, se muitos vierem converter os títulos, a ele lhe interessará precisamente não vir, porque o mecanismo da amortização, mesmo na 1ª série, poderá, repousando em bases mais estreitas, provocar alta dos títulos suficiente para cobrir os riscos da baixa de rendimento. Devo porém recordar que, estando garantida a conversão de parte importante da dívida, o Estado encontrar-se-á em condições legais e disporá de meios bastantes para poder defender-se da especulação abusiva dos portadores, se a houver e durante tantas dezenas de anos quantas teimasse em durar.
A BATALHA DA RESTAURAÇÃO FINANCEIRA DO PAÍS - (17)
(«Conversão do Fundo Externo» — Ao microfone da E. N., em 25 de Abril — «Discursos», Vol. III, págs. 221-222 e 224-226) – 1940 Consultar todos os textos »»
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