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As finanças, fulcro por excelência do mal crónico português, foram como todos sabem, no seu saneamento, fulgurante também – o seu a seu dono – o ponto de partida e o centro de irradiação da renovação nacional. Quatro coisas essenciais, passadas ao Ultramar, se fizeram no capítulo. 1º Os oito orçamentos das nossas colónias estão equilibrados desde 1933. 2º Liquidou-se quanto ao passado e regulou-se quanto ao futuro o regime das dívidas coloniais. 3º Estabeleceram-se para os domínios os mesmos modelos de clareza e simplicidade que, lá como cá, permitem facilmente compreender as contas públicas e publicá-las em dia. 4º Embora disperso, já existe nas leis o material bastante para fazer frente ao desperdício. É o que está a ser ultimamente compilado na reforma da Fazenda, que deve substituir o regulamento de Teixeira de Sousa, com quarenta anos de idade e outros muitos de esquecido. Falta ainda que nos aproximemos mais ainda da legislação da metrópole: encurtar tanto quanto possível o exercício, por exemplo, só trará vantagens. Não quero alongar-me sobre o assunto: Vejam V. Exas., do que sou capaz, ou incapaz, com medo de aborrecer-vos: fugir às finanças. Mas há aqui também uma palavra a dizer. Entendo que as circunstâncias mudaram muito para que o problema possa ser hoje considerado como há dez anos. Saíra-se então apenas de uma crise terrível – e não havia nem a experiência da administração nem as sólidas finanças e o crédito de agora. Esse o lado feliz do confronto. Por outro lado, há dez anos, a urgência de resolver não era a mesma. Os perigos no atraso são outros agora. Esse o lado desfavorável da comparação. Se temos, cá e lá, finanças em ordem e se temos crédito – isso importa sobretudo não como um ponto de chegada, mas como ponto de partida. Se há que meditar no destino do dinheiro, há também que seguir no caminho de empregá-lo. Essa a moralidade do caso feliz. Quer dizer. Finanças severas, mas dinâmicas. Tudo vai, de resto, ao seu encontro. Existem hoje capitais avultados em Portugal e em países cuja colaboração, sem quaisquer riscos, só nos pode ser favorável. O próprio vulto da circulação fiduciária e o seu tratamento adequado trazem consigo a dupla indicação – do sintoma e da terapêutica. Há também possibilidades de alargamento e aplicação imediata de circulação nas colónias. Só falta por vezes maleabilidade e mobilização bancária. Porque não faltam realizações e experiências, no género, pelo mundo. Com fins bem menos reprodutivos, por sinal… Quer dizer, o fim da guerra – se as circunstâncias presentes não sofrerem alteração – vem encontrar-nos em condições excepcionais para seguir viagem. Esse é um serviço sem preço que foi prestado ao País. Temos portanto o melhor. Por um lado, dinheiro e crédito. Por outro lado, onde o gastar com abundância, critério, proveito e glória. Só há duas coisas que não devemos fazer. Primeira: Transportar outra vez para o terreno académico a questão clássica de saber até onde deve ir a assistência financeira da metrópole. A assistência financeira da metrópole deve ir, em cada caso, até onde possa ser e for preciso. Será necessário acrescentar? Com dupla severidade, na escolha do objectivo e no controle do dinheiro? É a evidência mesma. Diga-se só ainda. Por outro lado, ninguém pode duvidar da legitimidade da acção tutelar da metrópole – e essa acção tutelar tem precisamente nas finanças o instrumento por excelência, para ganhar em autoridade moral, e já não é pequeno ganho. Por outro lado, as finanças têm maleabilidade bastante para assegurar o ganho material, criando créditos e débitos, escalonando as prestações e as contraprestações, na medida das disponibilidades e do tempo, das sementeiras e das colheitas. A segunda coisa que não devemos é esquecer-nos da existência dos capitais nacionais ou ter medo excessivo do capital estrangeiro. Pelo contrário, é preciso sabê-lo atrair. Simplesmente. Há algumas regras que presidem à política de atracção de capitais. A primeira é gastar o dinheiro preciso nas despesas preparatórias que incumbam ao Estado. Muitas vezes, só o dinheiro pode atrair o dinheiro. A segunda é, pelos estudos feitos, ganhar o Estado confiança bastante em si mesmo para, em cada caso, fechar ou abrir a porta ao emprego do capital. Só este saber distingue entre o desejável e o indesejável. A terceira é, depois de se garantir contra quaisquer perigos do dinheiro, garantir o dinheiro contra quaisquer riscos de insegurança. Porque o capital só entra quando se sente confiado. Em resumo. Este é o ponto sensível onde há que operar um milagre: o de caberem lá, ao mesmo tempo, a prudência e a coragem.
Lugar e destino de Portugal: a Nau e a Tormenta (09)
Lugar e destino de Portugal: a Nau e a Tormenta – conferência feita na Sala de Portugal da Sociedade de Geografia de Lisboa, em 9 de Maio de 1942. Na sessão solene de encerramento da «Semana Colonial» - Fernando Emygdio da Silva, prof. da Faculdade de Direito Consultar todos os textos »»
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