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Por disposição providencial e previdente acção política através dos séculos, nós temos a felicidade rara de constituir na Europa uma unidade geográfica; possuímos a mesma língua; constituímos a mesma raça; professamos o mesmo credo, e temos uma só cultura. Sobre este conjunto de elementos coesos a unidade política é apenas corolário e cúpula natural, que não foi afectada pela expansão ultramarina e a constituição do Império: por toda a parte a Mãe-Pátria conseguiu imprimir a sua imagem, fixar caracteres fundamentais, de modo que não é artificiosa criação a unidade imperial. Obra admirável da natureza e da política dos antepassados, ninguém poderá acusar-nos de a não termos desenvolvido e consolidado, criando-lhe novas bases materiais com a solidariedade económica e vivificando-a espiritualmente com profunda consciência nacionalista. Se esta obra repousa sobretudo na união dos espíritos à volta do maior interesse nacional, e se a união dos espíritos, com ser reflexo da unidade pátria, é também a sua maior força e factor de engrandecimento, nenhum dever sobreleva hoje ao dever de defendê-la. Por isso faço ligeira referência aos elementos que a podem prejudicar. O mundo anda aturdido. A rádio, o jornal, a revista; o informador, o comunicado, a gravura, a notícia, o comentário; os exageros, as verdades e o resto que não será nem uma nem outra coisa sopram em rajadas, desabam em bátegas fortíssimas, que escurecem o horizonte. Não se vê a dois passos. E embora alguns creiam ter-se atingido a saturação, quer dizer o enjoo e a inutilidade, sentem-se os espíritos embaraçados, enleados nas contradições, no excesso de pseudofactos e de ideias já feitas. Precisamente o que se pretende é que se não reflicta, se não deduza, se aceite uma verdade ou uma noção já prontas a servir, para fazer proselitismo. É claro terem-se excedido os limites duma completa, criteriosa, imparcial informação de factos e duma razoável defesa das teses opostas. Mas a luta não é fácil contra o abuso, salvo quanto a propaganda que utiliza certos meios gráficos, porque o intoxicado por si só procura de qualquer modo aturdir-se. Então se verifica não serem suficientes meios negativos, mas impor-se que a imprensa, liberta de servidões, senhora de si, marque a independência do nosso espírito e sua posição nos problemas essenciais. A propaganda excita as paixões, ao que somos atreitos em Portugal, e simplifica de tal modo as coisas, que há aí tal com ideias assentes sobre a grande estratégia e os problemas mundiais; muitos se admiram porventura de não serem ouvidos nos quartéis-generais, nem seus modos de ver escutados pelos grandes chefes. O nosso Tolentino já os tinha retratado: “É este concílio profundo, Sem ter um palmo de terra, Está repartindo o mundo.” Sentimentos exaltados criaram os partidos – os partidos do estrangeiro – tantos tanta vez esquecidos do interesse nacional. E assim entre paixões e disputas, com bandeiras e dísticos e insígnias, alguns portugueses se distribuem por vários cultos, e desertam o altar da Pátria. Ouço dizer, em defesa, que estão postos alguns problemas que devem interessar a todos os espíritos. Concordo e respondo: há nesta conflagração problemas universais que interessam a toda a humanidade e problemas que respeitam essencialmente apenas a alguns países; e assim como o filosofar vem para depois do viver, deve pensar-se que os últimos ocupam o primeiro plano nas preocupações imediatas. Nem de outra maneira se poderiam conceber as estranhas solidariedades manifestadas no conflito e alternadas camaradagens que se julgariam incompatíveis. Sobre os problemas de ordem universal temos feito clara profissão de doutrina; muito antes da guerra tomámos partido; sobre os outros não é correcto agora tomá-lo. Porquê e para quê dividirmo-nos à volta de interesses estranhos? Já é algum destes um interesse nacional? Quando o seja, não havemos de estar divididos, mas solidários e fortes na nossa unidade.
Florilégio de pensamentos- Algumas das Mais Belas Páginas de Salazar (57)
Solidários e fortes na nossa unidade - Discursos, Vol. III, págs. 334 a 337 Edições Panorama - Lisboa 1961
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