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Não sei como agradecer a alta prova de consideração e estima que a Universidade de Coimbra quis ter para comigo, precisamente quando se completam vinte anos sobre o dia em que fui obrigado a deixá-la e às minhas funções de professor. Vinte anos seriam tempo de sobre para esquecer e para ser esquecido, se não fora concorrerem no caso duas circunstâncias: a primeira, é serem demasiado fortes, para poderem quebrar, os laços da escola a que devemos a nossa formação; depois, é ter procurado não mudar no Governo o sentido da minha vida e tentado manter-me, em tão diverso domínio, fiel aos métodos e à ética dessa escola. Quando tanta coisa que parecia sagrada ou eterna se dispersa e dissolve no mar revolto que é o Mundo de hoje, faz bem atentar no valor de uma instituição que não atraiçoa o seu espírito nem se afasta da missão que lhe foi confiada. Por felicidade rara é-me dado ver aqui os que ainda foram meus mestres e da minha geração, contemporâneos e discípulos, mas também já muitos, muitos que não encontrei e de que apenas conheço os trabalhos e os méritos. E, no entanto, quem está diante de mim é o mesmo ser moral que vem afirmando-se desde séculos: quando estuda, quando ensina, quando se manifesta, é escusado perguntar, porque é Coimbra, é a Universidade. Neste gabinete de trabalho, onde a fraterna camaradagem coimbrã me permite recebê-los, a vida não tem sido fácil, nem doce, nem isenta das maiores preocupações e desgostos. De vez em quando, um raio de luz brilha e doira o ambiente. Parece então que é diferente a vida, tudo se passou sem deixar vincos na alma, e valeu a pena ter trabalhado, batalhado, envelhecido para gozar plenamente da estima ou da gratidão. Hoje foi assim. Em todo o caso, em todo o caso espero ansioso o momento de regressar...
Florilégio de pensamentos- Algumas das Mais Belas Páginas de Salazar (44)
À Universidade de Coimbra - Discursos, Vol. IV, págs. 321 e 322 Edições Panorama - Lisboa 1961 Consultar todos os textos »»
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