21 de novembro de 2024   
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Como sou dos chefes de governo que menos falam, levo tempo a arranjar matéria para um livro de Discursos. Este é o terceiro em quinze anos, à média de um volume por cada cinco anos de governo. Bem vistas as coisas, isto não é virtude mas defeito de que só me não curo por não poder. Será muito difícil que alguém tenha para cada dia ideias originais ou definitivas, planos ou comentários de interesse a que valha a pena dar alguma vida com fixá-los na escrita. Mas, dado que todos os regimes, embora o não pareçam, são hoje em maior ou menor grau regimes de opinião, mais assíduo contacto com o País, clareando a atmosfera política, só facilitaria a missão governativa: o essencial é saber avançar entre aqueles extremos em que a política se excluem ou repelem.
Atendendo à origem e natureza destes trabalhos, nunca se pode saber se a série há-de continuar ou terminará por aqui. Ainda que estivesse certo da última hipótese, que aliás só pequena parte está nas minhas mãos, não desejaria dar a estas palavras o ar pretensioso de testamento político ou solenidade parecida. Verdade é porém revelar a leitura do que em momentos sucessivos e já recuados entendi dever dizer, embora imposto por circunstâncias acidentais, que tudo foi suficientemente reflectido e sincero para a meus olhos não ter que ser alterado nem poder ser desmentido. Por outro lado, à medida que o tempo avança, trazendo consigo e por si só o irremediável duma tarefa que finda, apenas interessa, no governo e no País, o essencial e o permanente, e isso é irredutível a bem pouco.
Não sou dos que julgam que há uma verdade política; mas firmemente creio que há verdades políticas tão exatamente demonstradas pela razão e pela experiência como conclusões das ciências positivas. Os que julgam possuir a verdade na política e governo dos povos vão desgraçá-los com a imposição, até onde puderem, do seu elixir universal; os que não creem nas verdades políticas pouco se lhes dá dos regimes e dos governos, mudarão ao menor sopro as instituições dos países, dispor-se-ão a sacrificar com elas as garantias da sua própria segurança e vida colectiva, sem ver que há por vezes aí tentativas e manifestações … de domínio do exterior.
Eis porque sem esquecer a História com seu mostruário de instituições políticas que morreram, se revezaram ou rejuvenesceram, nem supor que se cria agora para a eternidade e tudo se conservará imutável no tempo, o que seriamente me preocupa é saber se, sim ou não, têm sido focados os problemas centrais da comunidade nacional e se, através de reformas de toda a ordem, e à frente as das instituições públicas, se tiveram presentes as verdadeiras necessidades e possibilidades da Nação portuguesa.
Que isso tenha sido percebido e devidamente apreciado pela generalidade dos contemporâneos não interessa senão ao momento político e em certa medida, pela calma da consciência pública e a tranquilidade que cerca o trabalho do governo. O que acima de tudo importa é que se tenha encontrado o verdadeiro caminho, seguindo o qual o povo possa viver tranquilamente a sua vida e a Nação cumprir a sua missão histórica, isto é, que se realize o que é essencial na vida e se seja fiel ao que é permanente na História. Só isso na verdade é transcendente para o futuro do País.
Os que, investidos em funções de mando, amorosamente se debruçam sobre o panorama da vida nacional no passado e no presente hão-de ter verificado que é muito mais simples definir as grandes directizes da vida colectiva do que determinar os processos de conduzir a Nação a seu contento. Mais ou menos vincadamente se vive em Portugal numa espécie de crise política endémica. Na grande massa do povo, ainda que iletrado, há, por intuição talvez, firme consciência nacional – a mais segura base da nossa independência como nação – mas não há, porque não pode haver, sólida consciência política. Por outro lado, aqueles que, oriundos dos vários meios, constituem o que deveria esperar-se ser a classe dirigente, falham em geral como condutores do povo e portadores de pensamento político. De onde ser em Portugal a Nação acessível a todos e o Estado a muito poucos. Para isso contribuem, cada um por sua forma, o homem e o meio.
O vinco na abstração do no pensamento e a vida política por vício da nossa formação intelectual dá imerecido e perigoso prestígio a fórmulas sem conteúdo real e a ideias sem aplicação prática. Mesmo fora dos períodos de exaltação em que por toda a parte afinal as multidões costumam embriagar-se de palavras e vagos sentimentos lhes dirigem a acção, o português vive e sacrifica-se, sacrificando também por vezes o País, a coisas irreais. Democracia, liberdade, reacção, progresso, além de outros, são no espírito de quase todos nós puros mitos, abstracções de

(Continua)

Florilégio de pensamentos- Algumas das Mais Belas Páginas de Salazar (21)

Matéria para um livro de Discursos – Discursos, Vol. III, págs. V a XV
Edições Panorama - Lisboa 1961 (1 de 2)

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Música de fundo: "PILGRIM'S CHORUS", from "TANNHÄUSER OPERA", Author RICHARD WAGNER
«Salazar - O Obreiro da Pátria» - Marca Nacional (registada) nº 484579
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