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(Continuação)
E assim, a conspiração caminhava quase ao acaso, ou ao acaso mesmo, embora com o maior entusiasmo, mas cada qual para seu lado, esperando-se o aparecimento do chefe que, aliás, todos criam, chegaria na altura própria. Na imprensa, principalmente no Século e na Época, criava-se claramente o ambiente propício para a eclosão da Revolução. No último destes jornais onde havia uma equipa aguerrida de jornalistas nacionalistas, o dr. Manuel Múrias fazia sob o pseudónimo de «Ansilianus» uma campanha activa e permanente, com o objectivo de dar coesão e consistência à Revolução, já então tornada inevitável. Eram artigos e entrevistas forjadas, com pretensos oficiais do Exército, sobre elementos fornecidos pelo general Sinel de Cordes. Mais ou menos por esta ocasião os tenentes, por lembrança de João Pereira de Carvalho, Pinto Correia e outros, resolveram escolher para chefe da «arrancada» o general Gomes da Costa. Pereira de Carvalho dissera mesmo, em determinado momento, ao comandante Mendes Cabeçadas, na altura em que este parecia tomar a chefia suprema da Revolução e se dispunha a comandar a «arrancada» de Braga, então o mais activo centro conspiratório, que a guarnição da cidade dos arcebispos estaria pronta a iniciar o Movimento desde que à sua frente surgisse um general. E lembrou o nome de Gomes da Costa. Mendes Cabeçadas concordou com Pereira de Carvalho e chegou a falar a Gomes da Costa que lhe afirmou estar na disposição de comandar os «rapazes» de Braga. Melhor informado, porém, e lembrado de como a intervenção do conhecido oficial da Armada impedira a «arrancada» de Setúbal, deu o dito por não dito, com o argumento de que o Governo estava sabedor de tudo quanto se passava. Que Gomes da Costa com este «volte-de-face» apenas queria fugir à camaradagem de Cabeçadas prova-o a resolução com que pouco depois viria a «arrancar» e a chefiar os «rapazes» de Braga. Enquanto, pois, a conspiração dos chefes prosseguia os «rapazes», os tenentes do 28 de Maio ardiam em impaciência e queriam a todo o transe a Revolução na rua. E neste sentido traba1havam activamente e, sendo poucos, porque interpretavam, no final, o sentir geral dos seus camaradas, pareciam muitos e na hora decisiva puderam trazer consigo todo o Exército. Entre os tenentes, designação que, por vezes, longe de significar o posto, queria antes referir o entusiasmo de conspiradores, tinham lugar de vanguarda os oficiais da guarnição de Braga, os major Mendes Norton, capitão Quadro Flores, Pires de Campos, Frazão, Carmona, Júlio Machado, Gonçalves da Silva, José da Luz Brito, João Nunes de Sequeira, Pernil, Poças, tenentes João Pereira de Carvalho, Daniel Braga, dr. Alberto Cruz, Monteiro, Leonardo Neves, Diamantino Leite, Alberto Branco, Oliveira, Paulo, Pacheco, etc.... Em Braga conspirava-se, abertamente, sem temores, à vista de todo o mundo, nos cafés, na Arcada, em toda a parte onde podiam juntar-se duas pessoas para comentar os acontecimentos escandalosos que dia a dia, vertiginosamente, se sucediam. Era principalmente na «messe» dos oficiais de Infantaria 29, dirigida pelo capitão João Sequeira, que os oficiais revolucionários se reuniam. Na Província nem só Braga vivia em plena actividade revolucionária. Em Setúbal os capitães dr. António Sousa Gomes, António Nunes Correia e Ricardo Durão e os tenentes Arnedo e Horta preparavam-se para «arrancar» também na hora própria. Em Mafra o capitão Aníbal Franco e os tenentes Adriano Dores, Norberto Múrias Capela e Brotas, principalmente, conspiravam com a maior actividade. Em Santo Tirso era Miguel Bacelar que também se entregava entusiasticamente aos trabalhos conspiratórios, nos quais, como oficial de Sapadores do Caminho-de-ferro colaborava desde a derrota do 18 de Abril. Foi o capitão Miguel Bacelar que logo após o fracasso deste movimento procurou o tenente-coronel José de Mascarenhas, chefe do Estado-Maior da 3ª Divisão, e que seria o ministro da Guerra do Governo derrotado pelo 28 de Maio, ao qual disse: «A derrota dos revolucionários do «18 de Abril» desgostou-me profundamente. Entre os vencidos está um oficial ao lado de quem me bati na Grande Guerra, de quem tenho sido sempre companheiro de armas e por quem tenho uma grande consideração quer como homem, quer como português de lei e militar dos mais ilustres: Raul Esteves. Desde este momento estou disposto a conspirar, por todos os meios, para fazer com que o Exército leve a cabo uma revolução que realize as aspirações do «18 de Abril» e ao mesmo tempo lhes dê aquela satisfação a que o seu patriotismo tem direito. Quero, pois, dar-lhe conta da minha atitude: eu vou conspirar. É muito possível que ao meu tenente-coronel não convenha na sua Divisão um elemento desta ordem e por isso lealmente lhe faço esta prevenção para que promova a minha transferência no caso de assim o entender...»
(Continua)
Documentos Históricos (06)
A arrancada de 28 de Maio de 1926, por Óscar Paxeco – 1956. Elementos para a história da sua preparação e eclosão.
… Mas faltava o Chefe para a "arrancada" (I de II).
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