3 de novembro de 2024   
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UM CAPÍTULO DE HISTÓRIA:
A CORRESPONDÊNCIA COM JOÃO FRANCO

Esta carta exige algumas explicações para sua compreensão, decorridos 30 anos sobre a data em que foi escrita e o desaparecimento do signatário. João Franco ocupou vários cargos ministeriais no reinado de D. Carlos, em que sobraçou as pastas da Fazenda, das Obras Públicas, do Reino e, finalmente a presidência do Conselho, entre Maio de 1906 e Fevereiro de 1908. A morte daquele soberano pôs termo à sua carreira política. O sucessor de D. Carlos, e último monarca português, e sua mãe, a rainha D. Amélia, reconheceram a impossibilidade de conservar João Franco no Poder e este foi convidado por aquele que lhe sucedeu o almirante Ferreira do Amaral, a deixar o País. Posteriormente, foi-lhe movido um processo que abrangeu, igualmente, os seus colegas do Governo da ditadura (Maio de 1907 a Fevereiro de 1908). Embora efémera, a passagem de João Franco pela pasta da Fazenda, no começo do reinado de D. Carlos, realçou a sua influência e prestígio como dirigente do Partido Regenerador, de que mais tarde (em 1901) se separou, para chefiar a cisão a que foi dado o nome de Partido Regenerador - Liberal, ou, como correntemente se dizia, Partido Franquista, pois vivia ele da figura destacada de Franco. A referência ao filho e netos entende-se com o Dr. Frederico Franco, que era estudante de Direito em Coimbra aquando do movimento académico de 1907. Tinha este o mesmo nome do pai de João Franco, o conselheiro Frederico Franco, influente eleitoral no distrito de Castelo Branco, de onde era natural e onde tinha valiosas propriedades a sua família. «Não se foi político por tantos anos e governante por não poucos», escrevera João Franco, na sua carta, denunciando a curiosidade da política que sempre o distinguiu e como se verifica, apesar do seu cepticismo sobre a possibilidade da restauração da monarquia, o não abandonou por completo. Costumava ele dizer que, para voltar à actividade partidária, seria preciso que ressuscitassem o rei, o que era uma forma de não se associar aos esforços restauracionistas de muitos dos seus antigos amigos e correligionários, um dos quais, o conselheiro Aires de Ornelas, exerceu, por largo tempo, o cargo de lugar-tenente de D. Manuel. Como se vê pela carta, o abandono da actividade pelos motivos que resumidamente expomos, não significava desinteresse, decorridos vinte anos sobre o drama do Terreiro do Paço.
A resposta do Prof. Salazar, então ainda apenas ministro das Finanças, enviada em 30 de Março, cinco dias antes da morte do seu destinatário, era do seguinte teor:

«Ex.mo Sr. conselheiro João Franco:
«Tenho adiado escrever a V. Ex., fugindo a qualquer banalidade, indigna de V. Ex.ª e de mim, ao agradecer-lhe as palavras que teve a bondade de dirigir-me. Comoveram-me tão profundamente que nada mais desejo sobre elas dizer a V. Ex.ª, senão isso mesmo.
«Há pouco mais de vinte anos houve um político que levantou em Portugal um brado de reacção contra o descalabro da administração pública e que o País, na sua parte mais desinteressada e sã, seguiu com mais do que com carinho, com fé. Alguém, obscuro, muito na verdura dos anos, sentiu, então, o contágio dessa fé e pergunta agora por que desígnio providencial recebe a carta de aplauso que então desejava escrever, se tivesse uma parcela da autoridade que V Ex.ª tem. Faço votos sinceríssimos pelas melhoras de V. Ex.ª e desejo-lhe do coração, umas Páscoas felizes. De V. Ex.ª mt.° att.° e grato,
(a) António de Oliveira Salazar.»


Documentos Políticos (17)

Correspondência de Salazar com João Franco, em 1929

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