|
..:. TEXTOS
(Continuação)
Minhas senhoras e meus senhores:
Temos até agora falado de inteligência e de acção, do trabalho mental, consciente e subconsciente, conduzindo aos actos pelo impulso da vontade. Como se o homem fosse apenas um cérebro em movimento. . . e isso não é tudo. Na distância que separa a inteligência da acção, interpõe-se o campo dos sentimentos, que desvia a bússola da rectilínea direcção própria dos juízos puramente mentais. E é tão forte a sua influência que se vulgarizou a frase de Pascal que diz: ter o coração razões que a razão desconhece. Ora, são os nossos sentimentos que formam a nossa estrutura moral. Tal como a intuição, no fundo a estrutura moral já nasceu connosco, mas amolda-se e aperfeiçoa-se pela vida em ambiente moral, pelos sãos exemplos do dia-a-dia, que são lições de todas as horas. Cria-se a consciência do bem e do mal, do justo e do injusto, cristalizam conceitos, que intervêm, sem os chamarmos à liça, na apreciação de factos e doutrinas, nos nossos julgamentos. E mais, muito mais do que no campo da ciência pura, tal acontece quando se trata de relações sociais, e portanto de política. Estou mesmo tentado a dizer que, nessa matéria, as ideias afloram à superfície da consciência como a espuma sobre as ondas: a espuma agita-se, brilha, desfaz-se; a água fica a mesma, que fez a espuma e a recolheu desfeita. Se, no domínio da volição intelectual, é difícil escapar à interferência dos sentimentos, necessária por vezes, o estadista, esse não pode, nem deve, fugir aos imperativos da consciência moral, e quanto mais alto está colocado menos tal omissão lhe é permitida. Aqueles que os esqueceram, ou que não tinham armadura moral, caíram no arbítrio das desvairadas resoluções; a história, inclusive a contemporânea, dá-nos a este respeito os mais trágicos exemplos, que é ocioso recordar, de tão conhecidos que são. Ora, ninguém contesta a Salazar um carácter moral, perfeitamente definido e sólido. É ele que faz das ideias os ideais, e dá a estes a direcção salutar, a fé no êxito, a perseverança na realização. É ele que mantém acesa a crença no futuro da nacionalidade, no esplendor de uma pátria feliz, digna e respeitada. É ele que inspira o zelo pelo bem-estar geral, como que sentindo dentro de si a ressonância da alma do povo, com seus cuidados e suas esperanças, suas alegrias a favorecer, suas tristezas a mitigar. É ele, enfim, que ditou o seu austero viver, de trabalhador incansável, modelo de trabalhadores. Este aspecto da personalidade de Salazar, aparentemente afastado do meu tema, fornece também uma grande lição, uma lição de moral. Pode dizer-se, com grande aproximação, que a moral não se ensina por prelecções nem por livros. Os conceitos morais, em que se alicerça a consciência, pouco devem a esses processos. Já notei que é o meio ambiente, a contemplação de exemplos vivos, que aperfeiçoa a qualidade da herança recebida da consciência dos antepassados. O exemplo é o melhor pregador, já o disseram muitos e há muito. Ora o exemplo de Salazar, pela nobreza dos seus ideais, pela constância na sua realização, pela fidelidade às promessas, pelo sacrifício de uma vida inteiramente entregue ao trabalho, dá aos portugueses esplêndida lição, cujo valor se mede pela altura de onde vem. Quando um professor possui uma personalidade moral com tais caracteres, exerce sobre os seus discípulos uma inegável acção educativa. Esse professor, colocado em elevado cargo de governação pública, passa a ter por discípulos todos os cidadãos. As lições de Salazar têm aproveitado; o meio social português vai melhorando, e para esse progresso o exemplo de Salazar tem sido factor relevante. Em conclusão: — creio ter demonstrado a importância que o espírito científico, inerente à função de professor, imprimiu à actividade de Salazar como homem de governo; que essa feição psíquica, embora não intervenha como factor único no sucesso da obra do estadista, tem lugar de vulto no complexo de elementos, constitucionais e adquiridos, de ordem mental e moral, que, em íntima conjugação, formam a excepcionalíssima personalidade de Salazar; e certo é que a acção de Salazar vale, tanto ou mais do que pelos frutos materiais, pelo melhoramento da mentalidade dos portugueses, base indispensável de uma pátria melhor e maior. O mestre de Coimbra tornou-se o mestre de Portugal. O tema deste modesto ensaio bem poderá intitular-se: Salazar, professor dos portugueses.
Minhas senhoras e meus senhores:
Nada mais teria a dizer, se não sentisse a obrigação de algumas palavras, e poucas serão elas, sobre a data que hoje celebramos. Vinte anos de trabalho, incessante e cada vez mais penoso, com as circunstâncias acumulando dificuldades, pondo tropeços à expansão plena dos programas traçados, à realização dos altos ideais destinados a transformar um pobre corpo cambaleante, de alma fraca e perturbada, num organismo vigoroso, num povo próspero e feliz! Contra a ventania da descrença quase geral, contra a saraivada de escolhos da conturbada época em que um destino atroz nos colocou, um homem caminha sereno, de fronte alta, indiferente ao cansaço, e às contrariedades, ouvindo apenas a voz da sua consciência, desprezando a tentação da fácil popularidade. Caminha sem cessar, levando a Pátria no coração. E a obra vai surgindo. A Nação parece outra, aos olhos dos portugueses e dos estranhos. Vinte anos! É um milagre, diz-se. De facto, parece milagroso. E o povo, o povo são, o que também labuta constantemente, com o heroísmo calado do cumprimento do dever, compreende-o e ama-o; curva-se respeitoso e cobre de bênçãos o nome de Salazar. Só o não querem os cegos de alma. Cegos uns por não terem entendimento para compreender outra coisa que não seja a satisfação imediata das requisições da vida vegetativa, ou que só olham para o dia-a-dia da obra dos Governos, e não sabem ver a frondosa floresta, mas dela apenas uma ou outra árvore que destoa da beleza do conjunto. Cegos outros, os letrados, os intelectuais, que têm obrigação de saber ver, mas a quem a ambição cega, e sobretudo a inveja. Não nos esqueçamos de que de todos os poderes o mais invejado é o poder do espírito; já foi essa inveja que entregou a Sócrates a taça de cicuta. Não importa. Nós o vemos, em toda a claridade da sua grandeza. E esta data servirá para unir mais os nossos corações de patriotas à volta de Salazar, o professor de todos nós, o maior mestre de Portugal!
(Fim)
SALAZAR - testemunhos... (12)
A Obra de Salazar à luz do sentimento histórico da sua época - por António de Almeida Garrett, Professor Catedrático e Director da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto - 28 de Abril de 1948 Consultar todos os textos »»
|