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E parto para a consideração de um ponto da mais alta importância. Quando a Argélia declara que constitui seu inclinável dever «libertar» Angola, não se compreende a afirmação porque não sabemos que entidade humana ou divina conferiu esse mandato àquele país. Quando o Presidente Sekou Touré diz que é sua responsabilidade «libertar» toda a África portuguesa, não se entende a declaração porque não se sabe quem lhe atribuiu tão grave responsabilidade. Quando de modo genérico se ataca Portugal em África apenas com o objectivo de atacar, mas sem apresentar razões, nem invocar argumentos, nem indicar factos, temos de nos perguntar o que estará por detrás e para além dos ataques. Se não se refuta a essência dos nossos princípios; se não se nega a validade dos nossos objectivos; se não ameaçamos nem afrontamos ninguém, se trabalhamos na paz e pelo progresso; se estamos prontos a colaborar com todos os de boa-fé-porquê, então, os ataques, a agitação, as campanhas internacionais? Por uma razão que os adversários não se atrevem a admitir nem confessam: é que não querem que exista qualquer vínculo entre uma parcela de território africano e um território não africano. Veladamente, já o proclamaram ao dizer que a África inteira não era livre nem se sentia em segurança enquanto alguma área estivesse ligada a áreas não africanas. Mas nós temos o direito de perguntar por que é isto assim. Não se compreende nem se pode admitir que a liberdade de um país ou de um povo sejam afectados ou dependam da estrutura interna de outras áreas ou povos que são pacíficos e não perturbam ninguém. Não se vê com clareza que Angola, província de uma Nação e nesta integrada em pé de igualdade, esteja por esse facto a ameaçar ou a comprometer a segurança e a liberdade do Tanganica ou do Tchad ou do Ghana. Não se vê também que ameaças à segurança ou peias à liberdade de outros possam advir do facto das estruturas internas de um território e da sua organização política e social serem diversas das de outros territórios. Numa época em que tanto se proclama a co-existência, seria lícito esperar que nesse desejo de co-existência se encontrassem as possibilidades de respeito para com os sistemas de outros. Se apenas se admite a co-existência de estruturas idênticas ou paralelas, destrói-se a própria ética da ONU, que assenta na pluralidade das ordens jurídicas e económicas e se destina a proporcionar-lhes um ponto de encontro, e anula-se a própria comunidade internacional, que se funda na diversidade. E não se sabe até que extremos poderemos chegar: porque as monarquias não se sentirão seguras enquanto existirem repúblicas; e os estados capitalistas não estarão tranquilos enquanto existirem países socialistas; e a breve trecho caminharemos para o mais horroroso dos antagonismos, que é o antagonismo das culturas e das raças. Estes são os perigos de ordem geral. Mas não respondem à pergunta concreta que formulei à pouco: porque somos atacados e por que motivo não esta segura a África, nem independente, enquanto Angola e Moçambique e a Guiné tiverem vínculos políticos e outros com o Portugal europeu? Porquê uma tão absurda doutrina? É simples a explicação: é que a execução ou aplicação daquela teoria leva necessariamente, inevitavelmente à destruição do que Angola é hoje e das possibilidades de futuro. Quer-se destruir o ocidentalismo em Angola, a igualdade das raças, e a sua integração, e o multirracialismo como forma de convivência humana e de estrutura sociológica; e querem-se criar condições que permitam dominar Angola em nome e para benefício de interesses não angolanos. Ao dizer isto, não estou fazendo simples especulação: estou expondo factos, que todos devemos ter sempre presentes no nosso espírito, como um aviso e como uma lição.»
Política Externa Portuguesa (01)
(Conferência proferida a 28 de Setembro de 1964, no Palácio do Comércio, em Luanda, pelo Dr. Franco Nogueira, Ministro dos Negócios Estrangeiros português) - Verdadeiros Motivos do Antagonismo de Certos Estados Africanos em Relação a Portugal Consultar todos os textos »»
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