Feitas as contas, todos lucraram: o público, que tem a água que quer; o Município, que pode lavar as ruas a agulheta e regar à farta os seus jardins; o Estado, que tem dotação ilimitada para abastecer de água as repartições, quartéis e outras instalações; finalmente, as casas de beneficência, instrução e recreio, que têm direito a metade do seu consumo por conta da dotação do Estado ou – o que é o mesmo – apenas têm de pagar o seu consumo à razão de 50 por cento do preço da venda ao público (1$ por metro cúbico, em vez de 2$).
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As fases das obras foram reduzidas para três, assim discriminadas:
1.ª fase. – Total da água a captar por dia, 150.000 metros cúbicos.
2.ª fase. – Total da água a captar por dia, 200.000 metros cúbicos.
3.ª fase. – Total da água a captar por dia, 250.000 metros cúbicos.
Com esta última fase concluída poderá bastecer-se em condições normais mais de 1 milhão de habitantes. Acontecerá isso quando estiver a expirar a concessão feita à Companhia da Águas de Lisboa (ano de 1974) ou talvez antes, se o crescimento da população de Lisboa e arredores for além do compasso verificado nos últimos dez anos, ou se todo o público da capital adquirir hábitos de higiene que ainda não tem, incluídos os habitantes que dispõem de água encanada em suas casas.
Vem a talhe de foice consultar a estatística referida ao ano de 1942, elaborada pela hoje Comissão de Fiscalização das Águas de Lisboa (sucedânea da antiga Comissão de Fiscalização das Obras de Abastecimento de Águas à Cidade de Lisboa). Mostra ela a existência, em Lisboa, de 170.800 domicílios, dos quais só 128.500 são abastecidos, directamente pela Companhia da Águas, e 42.300 sem contador, ou seja quase 33 por cento. É uma percentagem altíssima, que exige pronto remédio, tornando obrigatórios os encanamentos domiciliários logo que as obras da 2.ª fase (do contrato de 1842) estejam adiantadas.
E agora, antes de fechar, duas palavras ainda sobre o desenvolvimento do consumo desde 1932. Este, no Verão, não podia ir, com as restrições ordenadas, acima de uns 40.000 metros cúbicos por dia. Era o mais que podiam dar as nascentes do Alviela (Olhos de Água), pois, quase não contavam os escassos 2.000 metros cúbicos do aqueduto das Águas Livres.
Em 1942, o consumo máximo, no Verão, atingia 93.655 metros cúbicos num dia de Julho; e, em 1947, esse consumo máximo subia, em igual mês, para 135.584 metros cúbicos; mais de três vezes o de 1932!
Neste ano de 1948 deveremos chegar (ou andar próximo) dos 150.000 metros cúbicos, e o consumo médio deverá regular por 110.000 metros cúbicos por dia, roçando, assim, pelos 40.000.000 de metros cúbicos no ano inteiro, a que corresponde a capitação diária de 140 litros, índice de consumo já aceitável para as grandes urbes civilizadas.
Obra tão grandiosa, que, por ficar quase toda enterrada, quase se não vê – mal podendo ser adivinhada através de algumas marcas superficiais, como as claraboias, as casas de água e as casas dos cantoneiros que bordejam o aqueduto do Tejo – não tem sido, por isso mesmo, devidamente apreciada e louvada, como era mister. E, no entanto, trata-se de uma das maiores obras cometidas nestes últimos quinze anos. Só têm paralelo com a das Águas Livres – fábrica portentosa, devida ao Rei Magnânimo, que fez o assombro de quantos estrangeiros contemplaram o maravilhoso Arco das Águas Livres, émulo das mais célebres obras deste género da época romana –, que passa sobre o vale de Alcântara pelas alturas de Campolide¹ e com o aqueduto do Alviela, que tem a extensão de 114 quilómetros, e feito pela Companhia das Águas, empresa estritamente portuguesa, fundada em 1867 com capitais exclusivamente portugueses também (5.000 contos-ouro).
¹Murphy afirmou que, sob o ponto de vista da grandiosidade, não era inferior a nenhum dos aquedutos que nos deixaram os antigos. Kinsey referiu que a obra era um monumento estupendo da moderna audácia construtiva. Borrow podia assegurar confiadamente que não havia monumento de labor e de habilidade do homem, quer seja quer da antiga ou da moderna Roma que possa rivalizar com o aqueduto de Lisboa. É uma obra estupenda… Finalmente, e para não citar outros autores estrangeiros que tangiam a mesma nota do diapasão da verdade histórica, Oliver Merson acrescentava: Um monumento imenso e que nada tem a invejar dos trabalhos mais ciclópicos tentados e realizados pelos egípcios, gregos e romanos.
Assim falavam alguns estranhos ilustres. Para escarmento de tantos portugueses também ilustres, que desconhecem o aqueduto, aqui e àqueles se faz a devida referência!
(Continua)
(Parte CXII de …)
15 Anos de Obras Públicas – 1.º Vol. Livro de Ouro 1932-1947 (112)
(Fonte: 15 Anos de Obras Públicas – 1.º Vol. Livro de Ouro 1932-1947 – ÁGUAS DE LISBOA – João Carlos Alves – Presidente da Comissão de Fiscalização das Águas de Lisboa)